Por que o mundo odeia o Papa Bento XVI?
fonte: montfort
por:Abbé Régis de Cacqueray
«Se o mundo vos odeia, sabei que ele me odiou antes que a vós » S. João XV, 18. Esta advertência que Nosso Senhor dirigia a seus discípulos sem dúvida foi uma das mais graves. Ele os prevenia solenemente que eles nada deveriam esperar do mundo, porque
sua única esperança repousava nEle. Com efeito, logo que Deus enviou o
seu Espírito Santo, no dia de Pentecostes, aqueles que tinham zelo de
anunciar Jesus Cristo foram objeto da reprovação do mundo. Eles foram
expulsos das sinagogas, afastados dos fóruns, depois condenados,
decapitados ou crucificados. O Imperador os caluniou, os acusou dos
piores crimes, notadamente de ter incendiado Roma. À medida que a fé se
expandia, «os filhos da luz» eram executados, lançados aos leões e às piras, enquanto «os filhos das trevas»o sangue dos mártires é semente de Cristãos».
Sobre o sacrifício dos que preferiam morrer antes que renegar a verdade
revelada edificou-se a Igreja. Sobre os túmulos dos primeiros apóstolos
se erigiu a Cristandade. vaiavam, escarneciam e debochavam. Assim se cumpria a célebre máxima de Tertuliano: «
Certo, quando os príncipes reconheciam o primado de Deus
sobre as sociedades, quando os próprios reis sabiam se ajoelhar diante
de seu Criador, as perseguições cessavam, e se impunha a trégua dos
santos. Mas logo que a revolta humana se erguia orgulhosamente face ao
Senhor a advertência divina se confirmava: o Mundo odiava ao mesmo tempo Deus e seus discípulos. Nosso
país, sem dúvida alguma, foi o laboratório dessa funesta rebelião, e a
França tornou-se a triste nação que ousou perseguir ao mesmo tempo o
clero e aprisionar o Vigário de Cristo. Em 1799, o Papa Pio VI morreu
em Valence, em nosso território, então administrado pelos
revolucionários do Diretório.
Este mundo construído sobre o ódio de Deus
Desde então, o Mundo que nos cerca não cessou de renegar Deus.
Ele exigiu sua ruptura total com a Igreja; em múltiplas ocasiões, ele
fez perecer os sacerdotes que morriam aos milhares nos barcos do Loire,
no exílio da Guiana ou nos campos de trabalho, mais a leste; ele impôs
uma legislação que fazia desaparecer cada vez mais a moral cristã,
como tentava reduzir a religião à esfera mais privada, até o mais
fundo das consciências. Assim, as leis anti cristãs se
multiplicaram há duzentos anos para expoliar a Igreja, para atingir a
santa instituição do matrimônio, para matar as crianças antes de
nascer, para perverter os espíritos dos mais inocentes. Face ao inquietante futuro que se esboçava, o Papa Pio IX teve a clarividência de armar as almas, de preveni-las contra o perigo que se tramava: desde 1864, no Syllabus, catálogo dos oitenta erros que se propagavam, ele condenou muito firmemente a ideia segundo a qual « o Pontífice romano pode e deve se reconciliar e fazer um compromisso com o progresso, o liberalismo e a civilização moderna.»
Somente os livres pensadores ou os liberais lamentaram tal proscrição,
para continuar a querer adaptar a Igreja ao mundo que a odiava, para
querer emparelhar as duas Jerusalém, para fazer coabitar Saul, o
perseguidor e o apóstolo São Paulo.
Assim, como não se horrorizar quando os próprios homens da
Igreja, a favor do Concílio Vaticano II, se aventuraram a querer
adaptar a Igreja ao mundo, e mais particularmente a esse mundo aí, a
ponto de fazer dele seu primeiro objetivo e de abandonar o objetivo que
fora seu durante dois milênios, a saber a salvação das almas? Nós só
podemos subscrever a trágica atestação que Mgr Lefebvre redigiu
em 1976 ao ver, nessa estranha união entre a instituição fundada por
Cristo e aquela na qual age seu inimigo, um «casamento adúltero».
Porque como era possível colocar a Igreja ao diapasão de um mundo que
desejava ver a influência católica diminuir, a Fé se relativizar e a
moral fenecer, senão acomodando alguns de seus ministros com esses
espantosos desígnios?
Por quem cantam as sereias do mundo ?
Ora, à medida que os Papas modernos se engajavam nas novas
vias, rompendo com a Tradição – desde as celebrações ecumênicas até os
compromissos inter religiosos – esse mundo punha um termo a seu ódio e
aplaudia. A mídia e seus sinistros embaixadores
não tinham mais palavras para festejar os Papas que eles consideravam
solidários, abertos ao mundo, harmônicos com o seu tempo, conforme seus
critérios inquietantes. Eles não poupavam elogios para festejar, com a
reunião inter religiosa de Assis, a instituição de uma religião
universal na qual a solidariedade substituíra a verdade. Eles davam uma
publicidade sem igual às Jornadas Mundiais da Juventude para manter um
ambiente «bom filhinho», enquanto que se degradava a liturgia ao sabor dos caprichos locais. E
quando da morte de João-Paulo II, a mídia não se enganou: ela saudou
nele o Papa de Assis, o Papa do muro das lamentações, o Papa da ONU. Em troca, ela condenou o Papa da moral católica que tinha mandado embora juntos pornográficos e abortistas.
O Papa Bento XVI sucedeu,
então, um Papa imensamente popular do qual ele tinha sido o principal
colaborador. Ele não tinha se libertado da herança do Vaticano II e de
seus predecessores. Ele o disse textualmente, ele queria constituir-se
o seu continuador. E quando ele se recolheu na mesquita de Istambul,
quando ele rezou na grande sinagoga de Roma ou, quando, ainda bem
recentemente, no recente 14 de março último, ele participou ativamente
de um culto luterano avalizando a pregação de uma cerimônia dominical
no templo da Via Sicília, nós só pudemos nos indignar considerando mais
uma vez a ruptura total de tais práticas de confusão com a prudente
atitude católica observada pelos Papas até o Concílio. Ora, esses sinais são justamente os que permitem à mídia ter ainda alguma consideração por Joseph Ratzinger. Por esses gestos, ele era ainda, não há muito tempo, louvado, julgado inteligente e pacífico mesmo quando uma caçada já estava claramente organizada contra ele.
O mundo com a face descoberta
Nós assistimos com os punhos cerrados essa caçada ao Papa.
Que alcatéia infame! Mas quem são esses homens da mídia para se colocar
face ao Papa como modelos de virtude? Quem são eles para acusar a
Igreja Católica de todos os vícios e de todos os crimes?
Espontaneamente, vêem a nossos lábios as expressões das quais Nosso
divino Salvador se serviu para designar a classe político-religiosa
pervertida pela qual Ele foi julgado e condenado. São os mesmos sepulcros caiados, os mesmos fariseus. Eles odeiam Cristo como eles odeiam os que o seguem. Eles
entregam as sociedades que lhes são confiadas ao deboche e vêem pregar
a moral a um ancião cuja vida privada não lhes dá nenhuma ocasião à sua
sede de escândalo.
Bem sabemos infelizmente que houve quedas de sacerdotes e
quedas por demais numerosas. Sem dúvida sempre as houve, mas nós
consideramos que seu número foi aumentado pela tormenta que se abateu
sobre a Igreja e que deixou os padres desorientados, tendo que carregar
seu celibato sem receber as graças que lhes permitissem receber forças
para a renovação do Sacrifício de Nosso Senhor Jesus Cristo. Devemos
ter uma compaixão sem limites pelas crianças que foram suas inocentes
vítimas e nós devemos fazer de tudo para expiar escândalos que se
verificam ser infinitamente mais graves quando eles provem de pessoas
consagradas a Deus.
Mas nós recusamos essa mentira blasfema que faz crer
que os padres, por causa de seu próprio estado consagrado,
constituiriam um grupo «de risco». Pouco importam nossas
pessoas e a agressividade que essas campanhas midiáticas desenvolvem
contra o hábito eclesiástico. Não é nossa honra que está em questão mas
a honra de Nosso Senhor Jesus Cristo. Eles quereriam que cada um se
afastasse dessa religião cujas obrigações angélicas, reputadas ineptas
e insustentáveis, rebaixam finalmente os adeptos, segundo eles, abaixo
dos animais. Não nos deixemos abalar por essa infernal desinformação ! Expiemos
pelos pecados que foram cometidos, mas encontremos, à lembrança dessas
faltas, apenas o desejo de rezar pela santificação dos sacerdotes ou o
desejo de tornar-nos santos padres e padres santos.
A via crucis do Papa Bento XVI
Depois de muito procurar, só encontramos uma
comparação a essa perseguição e a esse "hallali" contra esse ancião: a
Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo. O mundo inteiro
parece se aliar contra ele e insultá-lo, assinar a sua pena de morte
midiática e desencadear contra ele os piores furores que exatamente
ninguém sabe onde vão parar. Nós gostaríamos muito de achar outra
referência que a da Paixão de Cristo que não é satisfatória em todos os
pontos, porque os contentamentos de um Mundo midiático, quando os
gestos inter-religiosos são feitos, ou quando a morte do Estado
católico é justificada pelo discurso papal, não calham de modo algum à
pessoa de Nosso Senhor. Entretanto, que outra comparação escolher?
Se assistimos, pois, do mesmo modo com o coração
angustiado a essa caça ao homem que nenhum dos três predecessores de
Bento XVI sofreu, interroguemo-nos, além disso, sobre as razões de
veredictos tão talhantes. A gente as encontra nos
processos urdidos pelos mesmos aduladores desse mundo: quando se trata
de resumir de modo arrasador os cinco anos do atual pontificado, são as
medidas de restauração que são citadas pela mídia, desde a liberação da
Missa tradicional até o levantamento das «censuras» oficiais que
tocavam os Bispos da Fraternidade São-Pio X, duas medidas que, a seus
olhos, favoreceram os defensores de uma fé e de uma moral sem
compromisso. De modo ainda mais particular, eles reprovam no Soberano
Pontífice uma condenação já firme e repetida do aborto, da eutanásia,
da união dos homossexuais, esses lamentáveis estandartes que se
tornaram o apanágio dos que querem construir uma sociedade sem Deus.
Mesmo, sem dúvida, sem muitas ilusões, sobre as dificuldades que o esperavam há cinco anos, quando ele foi eleito Papa, Bento XVI não imaginava provavelmente que seu pontificado seria uma tal via crucis.Entretanto, esse homem certamente não é movido pela busca da complacência de seus semelhantes. Se ele não pediu para ser Papa, uma vez eleito, ele quer cumprir o seu dever, o que quer isso deva lhe custar. Sem
gozar da mesma áura que seu predecessor, ele poderia podido viver
alguns anos sobre os benefícios de seu prestígio. Se ele tivesse
querido, não lhe teria sido difícil encontrar algumas concessões
suplementares a fazer à modernidade e aos grandes deste mundo para não
correr o risco de ser aquele que se faria de vítima.
Infelizmente, ele recebeu a formação de todos os padres de
sua geração, no curso de um período particularmente perturbado. E é
verdadeiramente bem lamentável que um tal homem tenha bebido em fontes
filosóficas e teológicas envenenadas – as de Karl Rahner ou de Hans Urs von Balthasar – e que se tornaram, enfim, o fundo de seu espírito. Não se pode, pois senão ficar embaraçado por
esse Papa que, ora, supera admiravelmente as borrascas de um mundo
odioso contra a Igreja, ora se faz aplaudir pela própria intelligentsia
porque seus gestos acariciam os desígnios de um mundo em busca de
solidariedade sem Deus; entretanto, as provações e as
desgraças são por vezes nossas melhores amigas para nos reconduzir à
luz da verdade e nos não devemos desesperar de seu caminho espiritual.
Nosso dever nessa paixão
Dessa crise na crise deve sair um maior bem. Jamais, desde
que se tem lembrança, o vigário de Cristo foi tão maltratado e
ridicularizado em sua vida e isso porque ele se contentou em defender a
moral católica. É preciso remontar à figura de Pio XII,
último Papa antes do Concílio, para encontrar um tal desencadeamento
contra um Soberano Pontífice e o que ele representa. O velho sonho do
aggiornamento, da adaptação a um mundo que seria preciso amansar quando
ele nos odeia, desmorona de modo manifesto. Devemos redobrar as orações
para que as autoridades da Igreja reconheçam com clarividência que as
alegrias episódicas de um Mundo que odeia Deus, quando esses mesmos
responsáveis parecem agradá-lo, são uma anomalia inquietante e mesmo
contrária à natureza da Igreja.
Longe de nos deixar dominar por um certo desespero ou, ao
contrário, por um relaxamento salpicado de bons sentimentos,
consideremos, que nossa santificação exige de nós que não retiremos
nada desse combate da Fraternidade São-Pio X iniciado por seu
fundador. Nós não imaginamos suficientemente a força do exemplo. Sem
dúvida, esta Fraternidade é apenas um instrumento. Mas a constatação,
não importa qual seja o observador, pode verificá-la: há quarenta anos,
enquanto a obra de Monsenhor Lefebvre se alarmava pelo afastamento dos
Papas com relação à Tradição, por seus gestos, ou por seu ensinamento,
o mundo aplaudia a eles. Em troca, quando o Papa era conspurcado e
debochado, ficava patente que a Fraternidade defendia a mesma verdade
que só era, em suma, o patrimônio da Igreja transmitido e ensinado.
Hoje, nós permanecemos banidos da Igreja. Mas o
próprio Papa se acha como misteriosamente transportado no campo de
nosso banimento. Sem dúvida, por ora não se trata ainda senão
do banimento oficial das sociedades civis sem Deus. Mas ninguém sabe o
que acontecerá em seguida. É bem sabido que os próprios amigos se tornam raros quando as tormentas se tornam mais violentas. Como
Cristo na proximidade da Paixão, o vazio pode tornar-se impressionante
em torno de um Papa, porque ele só terá aí, logo mais, golpes a sofrer
a seu lado.
Pedimos para nós mesmos a graça de não abandonar, no seu infortúnio, aquele cujo nome pode já estar inscrito na lista dos pontífices perseguidos. Nós pedimos para ele, se ele deve continuar a sofrer a amarga experiência da prova para o vazio, que ele saiba então distinguir que esses banidos da Igreja eram bem seus amigos e seus filhos mais fiéis.
Que a Santíssima Virgem Maria nos guarde a todos em seu Coração Doloroso e Imaculado!
Abbé Régis de Cacqueray ,
Superior do Distrito de França.
Suresnes, a 05 de Maio de 2010 na festa de São Pio V
Superior do Distrito de França.
Suresnes, a 05 de Maio de 2010 na festa de São Pio V