Caridade e Assistencialismo: Qual o caminho?

Quando se fala em caridade, vem a mente de muitos a distribuição de cestas básicas, dar sopão na rua, filantropias e atividades afins. O ser humano, num olhar assistencialista, é reduzido ao seu estômago. Então, saciar-lhe a fome é o máximo da caridade. Porém, o homem integral está além de seu aparelho digestivo e tem necessidades superiores que somente com a verdadeira caridade podem ser supridas.
Em tempos de programas assistencialistas governamentais, que na maioria das vezes tem propósitos populistas e quiçá eleitoreiros, quando o governo mata a fome do povo, causa a impressão que este está cumprindo o papel da Igreja, e que esta, com suas obras de caridade, perdeu sua razão de ser. Observando mais de perto as atividades assistencialistas do governo, percebemos que elas não atingem carências mais profundas e existenciais das famílias beneficiadas. Assim, estes benefícios são muitas vezes desvirtuados, e o dinheiro destas bolsas sociais não é usado para o fim a que se propõe. Há casos conhecidos em que o valor da bolsa família foi usado para compras de drogas, bebidas alcoólicas ou execução de aborto clandestino.
É necessário que resgatemos o significado da verdadeira caridade e a pratiquemos como deve ser feito. A caridade nos oferece uma visão holística do homem e de suas necessidades mais profundas. O ser humano não é visto de uma forma fracionada, mas por inteiro. Sabe-se que o homem é um ser insatisfeito por natureza, sua alma é inquieta e só encontra repouso em Deus, como afirma S. Agostinho.
O Santo Padre tem feito um esforço para recuperar o significado da caridade, vemos isto em suas encíclicas, especialmente a “Deus Caritas est”, em que ele diz que caridade – em grego ágape - eleva toda as outras dimensões do amor. Assim, a caridade é para ser vivida em todos os meios, na Igreja, na família, na economia, na política, etc. Sua Santidade desafia o mundo globalizado a viver a caridade na verdade em todas as esferas da sociedade. “O amor — « caritas » — é uma força extraordinária, que impele as pessoas a comprometerem-se, com coragem e generosidade, no campo da justiça e da paz. É uma força que tem a sua origem em Deus, Amor eterno e Verdade absoluta” (Caritas in veritatis). A caridade é teocêntrica, parte de Deus em direção ao outro. Portanto, quem pratica a caridade ama a Deus na pessoa do pobre; não troca Deus pelo pobre, como disse Clodovis Boff numa crítica que fez aos princípios da Teologia da Libertação¹(que anteriormente defendera), e não o instrumentaliza em políticas e “teologias” antropocêntricas cujo deus é o estômago (Rm 16,18; Fl 3,19).
Cristo mesmo nos aponta para esta caridade, quando após a multiplicação dos pães, dirige-se a multidão que o segue por causa alimento do material e apresenta-lhe a si mesmo como o verdadeiro alimento na Eucaristia. Ele, no capítulo 6 do evangelho de S. João, oferece-se como o pão da vida, do qual quem comer tem a vida eterna, a vida que transcende as necessidades materiais e que realmente nos preenche e satisfaz.
Precisamos escutar que a Igreja ensina sobre a caridade, estudar seus documentos e sua doutrina social, e abandonar uma visão reduzida de Igreja como “ONG” ou entidade filantrópica. A Igreja, como Corpo Místico de Cristo, em sua essência é caridade, então, ela nunca perde a razão de ser, ainda que vivamos num verdadeiro “paraíso social”.